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Publicado por Juliana Lopes, Revista Idéia Socioambiental - http://www.envolverde.com.br/
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Iniciativas demonstram vantagens de aplicar conceitos de sustentabilidade às residências.
Por desconhecimento ou conservadorismo, muitos profissionais da construção ainda são resistentes a incorporar o conceito de sustentabilidade à habitação, tanto é que as características essenciais das moradias mantiveram-se praticamente inalteradas ao longo de décadas. Mas o agravamento da crise ambiental tem forçado a reinvenção de toda a cadeia de valor do segmento de construção, que hoje é responsável por 40% da energia consumida e por 35% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Por trás dessa revolução, um agente ganha maior relevância: o consumidor que procura cada vez mais uma estreita relação entre seus valores pessoais e decisões cotidianas. Na busca por um estilo de vida mais sustentável, ele percebe que muitos de seus impactos estão dentro de casa e começa então a dar preferência a soluções que aliem qualidade, conforto, saúde, beleza e sustentabilidade.
Segundo Paola Figueiredo, vice-presidente do Grupo SustentaX, planejamento é a chave para aliar tais atributos em uma reforma ou nova construção. “É importante investir tempo no projeto e escolha dos materiais a fim de evitar retrabalho causado por eventuais mudanças ao longo da obra”, afirma.
Com o objetivo de desmistificar o conceito de sustentabilidade aplicado a moradias, a Sustentax criou o projeto Residência Sustentável. Com o apoio de profissionais e empresas parceiras, a iniciativa procura mostrar que é possível reformar e decorar uma residência, seguindo critérios socioambientais reconhecidos internacionalmente.
A instalação inaugurada nesta semana também estará aberta para visitação do público. O próximo passo é a mensuração dos resultados do projeto a fim de compará-los ao de uma residência convencional.
De acordo com Paola, a iniciativa tem caráter educacional e se justifica pelo fato de haver ainda muita confusão em torno do tema. O conceito de construções sustentáveis vai além da preservação ambiental e propõe a busca de soluções que proporcionem um equilíbrio entre o retorno financeiro e a minimização dos impactos socioambientais, incluindo a saúde das pessoas.
“Muitas matérias jornalísticas, por exemplo, associam sustentabilidade a um maior uso de vegetação, rusticidade, preferência de materiais como couro ecológico ou então velas no lugar de energia, entre outras características que nem sempre trazem benefícios reais em termos de eficiência do projeto”, reforça.
Novos parâmetros
As certificações lançam luz nesse cenário ao proporem diretrizes para construções sustentáveis. Ainda que estejam mais voltadas a prédios comerciais e conjuntos habitacionais, é possível aplicar seus princípios para moradias e empreendimentos de menor porte.
Ocupação racional do solo, eficiência e autonomia energética, gestão do ciclo hidrológico, gestão de resíduos e materiais, condições de conforto e saúde são alguns dos parâmetros para moradias sustentáveis.
Luiz Henrique Ferreira, diretor da Inovatech - primeira empresa de consultoria para Certificação AQUA, voltada para construções sustentáveis - reforça que a simples aplicação de materiais considerados sustentáveis não garante tais características.
O respeito às condições geográficas, meteorológicas e topográficas, bem como o alinhamento às questões sociais, econômicas e culturais do lugar também são fatores determinantes. Ferreira explica que a construção deve estar inserida em um contexto, assim a obra nunca pode ser pensada de maneira isolada. “A adequação a realidade local é importante, pois as residências mudam muito de país a país. Quando falamos de moradias, o aspecto cultural é muito forte”, ressalta.
Ainda segundo Ferreira, se pensadas no momento certo, tais melhorias não impactam muito os custos de um projeto. Foi o que a Fundação Vanzolini e a Inovatech demonstraram com o lançamento da Casa Aqua no ano passado. Trata-se de um protótipo de moradia popular baseado nos princípios da certificação internacional AQUA. A habitação de 40 m² custa R$ 45 mil, contra R$ 40 mil de um modelo convencional.
O projeto inclui um sistema de reutilização da água de chuva, formado por solo permeável e uma cisterna; aquecedor solar para chuveiro; telha de fibra de celulose; tijolos de solo-cimento, que conferem rapidez à execução dos fechamentos devido à modulação dimensional das peças e não utilizam argamassas de assentamento, reduzindo os custos. O próprio teto inclinado e com fendas foi projetado para aproveitar a luz e o ar naturais na residência.
Já na parte interna foram utilizados produtos ecologicamente corretos, como a placa cimentícia de madeira mineralizada, que não precisa de acabamento, e o revestimento de algumas paredes contou com embalagens Tetra Pak recicladas. A casa ainda possui vaso sanitário com caixa acoplada e descarga de duplo fluxo, que reduzem o gasto com água, além de lâmpadas fluorescentes.
Relação custo-benefício
Entre os itens que proporcionam a melhor relação custo-benefício, Ferreira destaca os paineis solares para aquecimento da água, cujo investimento pode ser recuperado em dois anos em uma residência com quatro pessoas. Chama atenção também para o uso de dispositivos economizadores de água, como arejadores, que proporcionam uma economia de 15% a 30% do consumo, e caixas acopladas de descarga com controle de fluxo de água: aciona seis litros ou três litros, volume suficiente para dejetos líquidos.
E nunca é demais atentar para os benefícios do uso de lâmpadas de baixo consumo (fluorescentes ou LEDs) e eletrodomésticos com etiquetagem A do Procel. Para se ter uma ideia, um freezer com o selo economiza 31% de energia, um condicionador de ar poupa 34%, e a lâmpada compacta, 75%.
A aplicação de parâmetros de sustentabilidade nas construções se mostra ainda mais vantajosa quando avaliados os benefícios no médio e longo prazo. Ferreira lembra que a compra de uma casa costuma ocorrer no horizonte de 30 anos, sendo que 85% do investimento desembolsado nesse período correspondem à manutenção e apenas 15% ao custo do imóvel. “As pessoas normalmente olham para a obra como uma grande vilã. Mas o fato é que 10% de acréscimo no valor do projeto pode representar 80% de redução do custo operacional no longo prazo”, explica.
Na opinião de Ferreira, essa conta ainda não é feita pelo consumidor que acaba optando por moradias convencionais com custo inicial mais baixo. Ele defende que a criação de linhas de crédito específicas para construções sustentáveis poderia reverter esse cenário. “O governo tem um papel indutor importante no fomento às construções sustentáveis, assim como os bancos que financiam moradias”, afirma.
A Caixa Econômica Federal, por exemplo, lançou o Selo Casa Azul: o primeiro sistema brasileiro de classificação socioambiental na construção habitacional. Mas, segundo Ferreira, essa prática ainda é incipiente e precisaria de uma padronização em relação à métrica utilizada. “À medida que cada banco cria uma avaliação específica de sustentabilidade, é possível que haja confusão no médio e longo prazo”, ressalta.
Parâmetros para construções sustentáveis
Ainda que não haja um padrão específico para residências, é possível aplicar princípios das certificações existentes para edifícios comerciais e conjuntos habitacionais:
LEED - Leadership in Energy and Environmental Design: é uma certificação para edifícios sustentáveis, concebida e concedida pela ONG americana U.S. Green Building Council (USGBC), de acordo com os critérios de racionalização de recursos.
AQUA - Alta Qualidade Ambiental: emitida pela Fundação Vanzolini para certificar construções que estejam de acordo com determinados padrões de impacto ambiental e eficiência energética.
Procel Edifica: concedido pela Eletrobrás, avalia a eficiência energética das edificações e o conforto ambiental.
(Envolverde/Revista Idéia Socioambiental)
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